Mas o que ocultaria a cave para o pai a proibir de levar
lá fosse quem fosse? Para mim, que chegava a dar crédito às minhas próprias fantasias,
teias peçonhentas de aranhas, infestados roedores, lagartos e rãs embalsamados e
talvez mesmo uma porção de esqueletos pendurados nas paredes, escarnecendo da
imortalidade.
O mistério haveria, porém, por ser desvendado quando
a amiga, não resistindo à tentação da proibida dentada na maçã, à luz de poucas velas, acabou por abrir a porta da cave:
Afinal, um pequeno cubículo onde se apinhavam caixas e caixas
de cartão, réguas, uma guilhotina, frascos, tinas, pastas de arquivos e, em
cima de uma bancada, um estranho aparelho cuja serventia ignorava.
O que mais relembro, porém, foi aquele momento mágico do finíssimo
pincel manejado pela amiga sob uma lupa, avermelhando as flores e o telhado de
um casebre; azulando o céu e branquejando as acinzentadas nuvens; colorindo esplendorosamente
de verde os campos de uma foto, a preto e branco, tirada pelo pai.
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