quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Reparação de válvula de embarcação


A embarcação tinha passado há pouco tempo por uma cuidada maquilhagem por forma a tapar fendas e poros, substituir uma ou outra gasta tábua e repor as tonalidades vivas das tintas, entretanto, empalidecidas pela moinha das intempéries.

Ficou como um brinquedo, com a sua velha idade bem camuflada e mostrando-se capaz de rumar, lado a lado, com qualquer embarcação, ao encontro da Santa.

No momento de saltar para ela, cheguei mesmo a compará-la levianamente comigo, como se eu, homem, tivesse alguma vez sido gerado num estaleiro, a partir de régua e esquadro; plaina, maço e serra, dotando-me de quilha, leme, proa e ré …

Aquele ronronar do motor a diluir-se na água e a espraiar-se no ar, à mistura com a inalação de umas lufadas de gasóleo, acabou por produzir em mim um efeito sonífero que nem o mais eficaz barbitúrico.

Até um alarmante berro quase me furar os tímpanos. O motor tinha-se calado, o que nos impossibilitou de perseguir a rota até à Santa.

Se este episódio fosse narrado num romance, previsivelmente a falha do motor teria ocorrido no alto mar  e não  com o Montijo à vista.

Admito - como alguém alvitrou -  que o coração da embarcação tenha sido reanimado pouco tempo depois, por obra e graça da Santa, em parceria com as experientes mãos do Mestre, - acrescento eu - deixando-me apenas uma perplexidade:

Por que razão a Santa  impediu que nos abeirássemos de si? 

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